Em Moçambique os megaprojectos contribuiem com muito pouco para o país, segundo um relatório sobre as contas do Estado publicado pelo Tribunal Administrativo. Em 2010 os oito megaprojectos contribuiram com apenas 0,004% para as receitas do Estado, o equivalente a 83 milhões de euros, e 0,001 para o Produto Interno Bruto. Consideram-se megaprojectos as empresas com investimentos acima de 500 milhões de dolares. No país quase todas elas estão isentas de pagamentos de impostos, facto contestado há alguns anos internamente e externamente, mas o governo moçambicano não renegoceia com as grandes empresas os contratos. Será normal que empresas com grandes rendimentos contribuam com tão pouco? O economista moçambicano Lourenço Venissa respondeu a esta e outras perguntas:
Lourenço Venissa: De facto era de se esperar que os megaprojectos tivessem uma contribuição muito acima do que estão a dar actualmente. A explicação para isso tem a ver com a história da instalação dos megaprojectos. Como se sabe logo depois do acordo de paz, em 1992, houve necessidade de atrair investimentos para o país e se criou condições para isso, com leis específicas para atrair projectos dessa dimensão. E houve necessidade de se fazer concessões nessa altura, meados dos anos noventa, mas o contexto hoje é outro, Moçambique hoje está numa melhor posição negocial e por isso seria de todo o interesse mudar esta posição revendo os contratos e curso.
NI: Há tempos que havido pressões internas e externas para que o governo moçambicano renegoceie os megaprojectos que estão isentos de pagamentos de impostos. Entretanto, nada aconteceu até agora...
LV: Existem duas posições bem claras; os que defendem que não adianta renegociar os projectos porque isso criaria uma imagem negativa do governo, porque se trata de acordos e contratos, e quando estes existem é necessário que haja alguma estabilidade. Então, quando se renegoceia significa que os contratos não são estavéis e põem em causa a credibilidade do governo. Por outro lado, existe outra posição que defende que renegociar é um processo normal em função de novas variáveis. Quando há uma negociação em que todos saem a ganhar, ela perdura sem necessidade de renegociação. Mas quando há uma negociação de curto prazo, em que apenas um lado ganha, então é preciso se renegociar. Estamos a falar de contratos em que os megaprojectos estão a ganhar muito dinheiro, e isso não é segredo para ninguém, as suas contas são auditadas a nível internacional, e o Estado moçambicano está a perder muito dinheiro. Agora, o porque de se manter este contratos, já depende da sensibilidade do governo. Eu penso que a nível do governo existem algumas posições que insistem em não voltar a mesa de negociações.
NI: Muitos desses megaprojectos, que estão isentos de pagamento de impostos, tem por obrigação contribuir para o desenvolvimento das comunidades onde estão inseridos. Mas os bispos católicos pedem a esses megaprojectos mais impactos das suas acções na vida dessas populações. Para si, as acções dessas empresas são suficientes se se comparar com os seus rendimentos e a isenção fiscal?
LV: Claramente que estamos a falar de algumas participações muito pontuais que se enquadram na obrigação social que esses projectos tem, mas isso não tem um grande impacto. Por exemplo, no caso de Tete, onde algumas das concessões mineiras estão a criar problemas na vida das pessoas, a sua contribuição é irrisória. Questiona-se a vários niveis esse tipo de acordos.
NI: Então pode-se dizer que o governo moçambicano ainda não está a saber negociar com megaprojectos vantagens com as populações?
LV: Nesse aspecto sente-se uma ausência da acção do governo e isso tem sido posto em causa, e não se percebe porque. Há também questões políticas, alguns actores políticos consideram que outros políticos, possivelmente, tem alguma participação ou interesses. Então, não se entende muitas vezes o que se está a passar, mas a sua contribuição é irrisória e não tem impacto nenhum na vida da população e não se pode pensar que as soluções de responsabilidade social são suficientes.
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