sábado, 25 de fevereiro de 2012

Jonas Savimbi: anjo ou diabo?

Quem foi realmente Jonas Savimbi? Uma resposta consensual nunca existiu; para uns o fundador da UNITA foi um grande homem, mas para outros quase um diabo. E quem tenta apresentar as facetas desse homem é o jornalista português Emídio Fernando no seu livro intitulado: " Jonas Savimbi: No Lado errado da História", lançado a propósito dos 10 anos da sua morte, onde destaca claramente que a "única e verdadeira ambição deste homem era ser presidente da República." 



Nádia Issufo: Porque escreveu este livro?
Emídio Fernando: É para assinalar os dez anos da morte de Jonas Savimbi e sobretudo porque desde a sua morte ainda nao tinha sido lancada uma biografia. Alias, ele é pouco biografado, tem uma biografia lançada em Portugal e algumas lançadas pelo biográfo dele oficial. Deixe-me dizer que esta é uma biografia clássica no sentido de que conta a vida privada dele, desde que nasceu até a morte, é não é uma biografia política sobre a estratégia dele, as alianças que fez, o seu posicionamento político, o que é mais importante para mim, do que a da vida dele pessoal.

NI: Diz no livro que a única ambição de Jonas Savimbi era ser Presidente da República. Como chegou a esta conclusão?
EF: Ele sempre teve uma ambição desmedida desde o início. Resumidamente, desde 1960 aproxima-se do MPLA e esclarece que quer ser vice-presidente do movimento, isso porque já sabe que Agostinho Neto era um líder carismático e o MPLA rejeita-o e depois passa para a UPA, depois FNLA, onde ocupa o cargo de ministro dos negócios estrangeiros no exílio e usa o FNLA, os seus contactos e o seu dinheiro, para fundar a UNITA. E forma este movimento de acordo com o que ele pensa, os planos e estratégias são dele, o próprio ramo militar da UNITA é criado por ele. A partir dai ele é incontestavelmente presidente da UNITA, porque toda a gente o acha assim, e porque é a pessoa melhor formada no movimento, mas sobretudo porque ele exige que seja assim, e vai induzindo isso ao longo dos anos. Nos anos secenta quando é ameaçado pela liderança, mata dirigentes que fundaram a UNITA, nos anos oitenta repete a mesma operação, mata uma figura de grande presença, Tito Chinguje do Bailundo, de uma família muito conceituada em Angola, unicamente para manter o poder na UNITA.

E depois quer ser o presdiente de Angola, ele faz um acordo com o colonialismo português antes da independência, onde faz um acordo, denuncia as movimentações do MPLA e combate este movimento e o MPLA juntamente as tropas portuguesas, e faz um acordo com as tropas portuguesas em que passaria a ser governador do Moxico, e depois percebe que Portugal nunca vai respaitar o acordo e e depois quebra o acordo.

E depois nos anos oitenta diz que quer o sistema multipartidário, isso porque quer apoios externos, mas de facto ele não tem essa intenção. Tanto é que entra nas eleições a dizer que quer ser presidente, ele nem aceita a ideia de partilhar o poder, faz as eleições de arma na mão, e por isso a derrota dele.

NI: Numa única palavra como qualificaria Jonas Savimbi?
EF: Numa única palavra é difícil, mas era lunático, absolutamente maquiávelico, com alguns traços de loucura visiveis em várias acções e extremamente ambicioso.




NI: Revê Jonas Savimbi na UNITA de hoje?
EF: Não, de todo. A UNITA hoje sofre com os efeitos de Jonas Savimbi porque tem de recuperar os muitos anos de guerra que fez.Savimbi só teve só uma qualidade, proprcionou formação aos seus membros e hoje são quadros bem formados e inteligentes. Apesar de serem formados, Savimbi obrigava-os a combaterem na mata. E esses quadros formadas obrigados a combater na mata hoje são quadros políticos, empresários, professores universitários e levam uma vida perfeitamente normal. Mas outros abandonaram a UNITA, já não querem aquele tipo de movimento, outros se aproximaram do MPLA outros afastaram-se da política. Os que continuam na UNITA são os filhos de Jonas Savimbi.

NI: Apesar de ser uma figura controversa, Savimbi é uma figura incontornável quando se fala em alternância política em Angola. Para si, qual é o nível de importância que este homem tem para o país hoje e amanhã?
EF: A grande importância, por ironia do destino, foi o dia da morte dele, porque a partir dai Angola passou realmente a viver em paz. Costumo dizer que Angola teve a segunda independência nessa altura, a primeira foi a 11 de Novembro de 1975 



segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

STP, uma província de Angola...

O presidente de São Tomé e Príncipe, Manuel Pinto da Costa, visitou Luanda na última semana. Os assuntos abordados com o governo angolano foram mantidos no segredos dos deuses, embora os dois governos falem no reforço da cooperação e da amizade entre as duas partes. Entretanto, nos últimos tempos Angola aumenta os seus investimentos em STP e noutros países africanos. Ouvi, através da DW, o economista angolano Heitor Fernando sobre as relações entre os dois países:

Nádia Issufo: Qual é a importancia dos investimentos angolanos para STP?
Heitor Fernando: São Tomé e Príncipe é considerado mais uma província de Angola, com o devido respeito a soberania do país. O tratamento que tem sido dado a STP, sob o ponto de vista governamental, é privilegiado, quer seja no domínio económico, político-admnisitrativo e até no domínio militar. Lembro-me que houve problemas graves de golpes de Estado no arquipélago, em que Angola desempenhou um papel crucial. Há ligações fortes entre as classes dirigentes dos dois países, não vale a pena entrar em pormenores.

NI: Mas sob o ponto de vista económico?
HF: Angola tem uma presença marcante em STP, ele é o maior fornecedor de combustível, fez alguma incursão do ponto de vista industrial, está presente na construção civil, principalmente através da Sonangol e continua presente no domínio militar e da hotelaria.


NI: Sim, mas como o senhor avalia esta relação? Nós gostariamos de ouvir a sua análise...
HF: STP tendo Angola como um parceiro que está a registar um crescimento positivo, os dois países podem manter relações num patamar aceitável. Isso não é negativo, é preciso que um país como Angola procure manter boas relações com os parceiros da CPLP, e particularmente com os países africanos.

NI: Quais são os beneficios para STP?
HF:  Em termos de benifícios imediatos é um pouco difícil, repare que STP tem muito pouco a dar Angola, diga-se de passagem...

NI: E o petróleo que existe em STP não é nada?
HF: O petróleo ainda não começou a ser explorado, ainda estão na fase de prospeção, isso será para um futuro próximo. Enquanto isso não acontece a relação económica é uma boa política...

NI: E não há interesse de Angola no petróleo de STP?
HF: Há e já houve antes, mas parece que Angola ficou um pouco para trás, beneficiou-se a Nigéria. Sabe que STP fica próximo da Nigéria e houve ai interesses no off-shore que apanha também a Nigéria e por isso STP achou melhor estabelecer relações com o vizinho. A Nigéria produz mais petróleo que Angola. Mas as relações entre os países não se devem limitar a um único produto de exportação. Veja que esse tipo de relações acontece agora também com a Guiné-Bissau e também com a Guiné Equatorial, soubemos que Angola mantém já há algum tempo uma presença policial na Guiné Equatorial, outro país que produz petróleo. O governo anda a diversificar as sua relações com o mundo...

NI: E isso é uma boa política?
HF: Acho que não. É preciso haver limites, você nã pode apoiar os pobres de outros países quando você tem milhares de pobres no seu próprio país. É verdade que tem de haver sentido de solidariedade, mas não se pode perdoar dívidas a outros países quando você tem dívidas com instituições financeiras e empresas no seu próprio país. É preciso sempre que haja equilibrio, é preciso fazer o trabalho de forma transversal e não porque fulano de tal é meu amigo e eu tiro dinheiro dos cofres de Estado em detrimento do meu país. É ai que manifesto a minha indignação...

NI: Mas esta não será uma tentativa do governo de Angola de se posicionar melhor a nível externo?
HF: Não, as relações entre países fazem-se mais por interesses económicos, porque as pessoas passam e os países continuam. Portanto, tem de haver contrapartidas, vantagens reciprocas. Equacionar as coisas em termos de simpatias pessoais não é boa e geralmente tem uma visão imediatista, nós temos de ver o país a longo prazo. Por exemplo, STP tem agora um presidente que é próximo ideologicamente do partido no poder em Angola e as coisas agora vão correr de uma forma, mas quando estiveram outros as coisas correram de outra maneira.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

A nomeação estratégica de Manuel Vicente

O presidente de Angola anunciou na última segunda-feira mudanças no seu executivo. Uma das novidades é a re-criação do cargo de ministro de Estado da Coordenação Económica, a ser ocupado por Manuel Vicente, ex-responsável da empresa Sonangol. Também José Eduardo dos Santos anunciou a formalização do funcionamento do Fundo Petrolífero. Segundo a presidência um dos objectivos destas remodelações é reduzir a concentração de tarefas. Entretanto, estas mudanças acontecem pouco tempo antes das eleições no país. Entrevistei, para a DW, o enconomista angolano Justino Pinto de Andrade sobre as remodelações e comecei por lhe perguntar se o cargo de Ministro do Estado da Coordenação Económica não se sobrepõe ao cargo do ministro da economia:

JPA: Eu não sei como as coisas vão funcionar, porque quando foi extinto esse cargo, criou-se logo o cargo de ministro da economia. É evidente que o ministro da economia, do ponto de vista hierarquico não tem o mesmo posicionamento que o ministro de Estado, portanto fica a baixo. Também o ministério da economia não tem influência sobre os outros ministérios ligados a áreas económicas, enquanto que o ministro de Estado tinha.
Ao criar-se este cargo eu acredito que haverá um re-arranjo ao nível da economia, e até acredito na extinção do ministério da economia. Acho que alguns ministérios ficarão tutelados ao novo ministro de Estado para a coordenação económica, e um deles será seguramente o das finanças. Também os ministérios ligados as infra-estruturas poderão ficar subordinados ao novo ministro.

NI: Será por acaso o novo ministro de Estado também uma espécie de acessor do presidente para questões económicas internas e até externas?
JPA: Eu penso que o presidente ao criar o cargo a esta altura, quando faltam cerca de sete meses para as eleições, ele quer por a rodar uma figura muito falada nos últimos tempos, porque uma das acusações que pesam sobre essa pessoa é de não ter experiência governativa, embora tenha experiência empresarial. Essa figura e o presidente da Sonangol.

NI: O crescente investimento angolano em Portugal, nomeadamente nos bancos, pode ser interpretado como uma tentativa de Luanda usar Lisboa como uma porta de entrada para o mercado europeu?
JPA: Eu não vejo as coisas bem assim, porque nós também não temos muito para exportar para esse mercado para além do petróleo. Penso que o nosso petróleo é bem vindo na Europa com participação ou sem participação nos bancos portugueses. Acredito mais que a ideia é agilizar os gestores angolanos num mercado mais fácil de ser gerido, que é o mercado português, para transformar essa plataforma em outros voos mais arrojados. Agora é evidente que com esta participação pdemos aumentar a nossa capacidade de mobilização de recursos para financiar empreendimentos em Angola, que estão a ser feitos com a participação de empresas portuguesas.

NI: José Eduardo dos Santos formalizou também o Fundo Petrolífero. Como vê esta instituição no contexto das polémicas sobre a gestão dos recursos petrolíferos?
JPA: Eu espero que este Fundo seja um Fundo do Estado e que não se transforme em algo mais ou menos privado e gerido ao gosto dos que domina o poder. Este Fundo para fazere sentido tem de ter algum controlo, e um controlo mais vasto que uma pessoa, tem de ser um controlo institucional.

Oiça a entrevista em:
http://www.dw-world.de/dw/article/0,,15703882,00.html

Caso Vale: governo moçambicano explica-se

No âmbito dos descontentatementos em Cateme, por causa do reassentamento no contexto da implantação da multinacional brasileira Vale, a DW ouviu a explicação do governo moçambicano. Albertina Tivane, Secretária Permanente da província de Tete e também responsável pelo reassentemanto nesta província, começa por explicar como foi conduizido este polémico processo:

Albertina Tivane: O governo encontrou cinco locais para realojar a população, depois de um estudo de impacto ambiental, e chegou-se a consenso, incluindo com a Vale, e concluiu-se que o lugar devia ser Cateme. O processo foi sempre liderado pelo governo, mas na altura houve argumentos apresentados pela Vale que pesaram para a escolha de Cateme.

NI: Segundo o CIP a Vale apresentou 10 lugares de reassentamento ao governo e ainda segundo ONGs e a sociedade civil, o governo escolheu a pior de todas. É verdade?
AT: Não corresponde a verdade, quem escolheu foi o governo e na verdade foram quatro os lugares, porque quem conhece a região é o governo. As regiões eram: Samoa, Nhangoma I, Inhangoma II, que é Cateme, e Capanga. Acontece que alguns lugares entravam em conflito com a implantação de outros projectos. Posto isto, a própria empresa fincou pé, insistindo que fosse Cateme.  

NI: A população diz que Cateme não oferece condições de sobrevivência, mas o governo escolheu este lugar...
AT: Nestes processos de reassentamento há sempre dificuldades, mas é possível se produzir em Cateme. O governo está a criar condições lá para que a população possa desenvolver as suas actividades.

NI: Eles tem acesso a água e terra boa para agricultura?
AT: São essas as condições que estão a ser criadas. Há curso de água próximo de Cateme, é verdade que podemos melhorar o acesso a água, assegurar que possamos abrir represas. Nessa região onde estão reassentadas as pessoas já era habitada, portanto se Cateme não oferecesse condições de habitabilidade não haveria lá ninguém.

NI: O governo supervisionou as casas disponibilizadas pela Vale?
AT: Temos que reconhecer que houve alguns problemas em relação as casas, no que se refere a sua monitoria. A supervisão foi feira pelo governo, atraves da direcção da obras públicas e habitação e foram detectadas anomalias e algumas foram corrigidas e outras não.

NI: Face a esta crise que soluções o governo tem para a população?
AT: Se é uma crise, é uma crise de desenvolvimento. O governo olha para o reassentamento como uma oportunidade para o desenvolvimento. As novas áreas são embriões de uma nova vila ou de uma futura cidade....

NI: Sim, mas neste momento a população está descontente. O que o governo está a fazer?
AT: Nós sempre estivemos a trabalhar com a população. Primeiro fizemos um levantamento com a população sobre os seus problemas, elas dizem que a Vale fez promessas e não está a cumpri-las. Algum pessoal da Vale foi fazendo promessas a população sem o conhecimento do governo. O governador de Tete conversou com os líderes das comunidades para saber melhor das tais promessas. E depois sentamo-nos com a Vale que reconeheceu que algumas foram feitas. Mas olhando para a natureza delas, algumas não fazem sentido, como por exemplo, elas dizem que a Vale prometeu construir um campo de futebol de onze coberto, ou que prometeu dar comida gratuitamente durante cinco anos. Portanto, estamos a desenvolver planos de acção para que a população consiga ser autonóma. Queremos implantar projectos de geração de rendimentos.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Premiação da Vale é mais uma arma para as ONGs

A Empresa brasileira Vale venceu na última semana o prémio Nobel da vergonha corporativa mundial, distinção feita a pior multinacional no que se refere ao respeito ao meio ambiente e direitos sociais dos trabalhadores e por optar por uma linha muito direcionada para o lucro. Em Moçambique, esta empresa, que explora minas de carvão mineral, enfrenta uma crise devido ao realojamento de populações em lugares considerados impróprios para a sobrevivência. No começo do ano centenas de pessoas que se manifestaram contra a Vale foram reprimidas pela polícia. Sobre esta distinção, atribuida a margem do Fórum Mundial Económico de Davos, Suiça, a DW entrevistou Jeremias Vunhanje da ONG Justiça Ambiental sobre o prémio da Vale:

JV: Com certeza que não só para a Justiça Ambiental, mas principalmente para as famílias que vem os seus direitos violados devido ao trabalho da Vale, esse prémio é justo e ultrapassa a dimensão da justiça. Acima de tudo amplia a resistencia nas denúncias dessas famílias que tem estado a manter diálogo com a empresa, mas está a ser difícil. O prémio também confirma os graves impactos negativos que essa empresa tem estado a causar a par das violações dos direitos humanos e das liberdades fundamentais. Também achamos que é um marco findamental na discussão das políticas de desenvolvimento do país, é uma espécie de chamada de atenção para uma reflexão profunda sobre a forma como estão a ser feitos os investimentos estrangeiros.

Nádia Issufo: Apesar das falhas que se apontam a Vale importa lembrar que as mesmas terão acontecido porque o governo moçambicano provavelmente não agiu em defesa dos interesses da população. Entretanto a este facto não tem sido dado o devido destaque...
JV: O governo mais uma vez tem estado a  posicionar-se do lado da empresa perdendo a oportunidade de ouvir as reclamações da população. Nós estamos a acompanhar este caso há dois anos, e temos conhecimento de várias cartas que a população submeteu ao governo distrital, ao municipio de Moatize e ao governo provincial de Tete, inclusive no ano passado a comunidade solicitou a intermediação da JA que facilitou o diálogo com o ministério dos recursos minerais, o ministério da admnistração estatal, incluindo a Assembleia da Republica. Mesmo com as evidências que reunimos o governo não respondeu positivamente. Mais uma vez , com estas manifestações, o governo continua a fuxgir as suas responsabilidades.

NI: Fora este reassentamento polémico, existe outra falha a apontar a Vale?
JV: Pelo curriculum que agora veio a confirmar-se em relação as más práticas que a empresa tem nos cerca de 38 países onde opera, há certamente outras razões a apontar a Vale. Tem a ver com a constante falta de cumprimento de promessas e muitas vezes põe a população das regiões onde está em confronto com o governo, também há relato de perseguições protagonizados pela empresa. No caso de Tete ainda não temos uma confirmação exacta, mas há relatos de perseguições e intimidações a membros da comunidade, principalmente daqueles que exercem liderança e que estão a frente das exigências em relação as suas condições de vida.

Saiba mais sobre o assunto consultando a seguinte página:
http://www.dw-world.de/dw/0,,13918,00.html?id=13918