segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Corredores complexos ou labirintos?

Que cenários a Africa Austral, e Moçambique em particular, pode assistir por causa dos corredores ferroviários da Beira e de Nacala? Sob o ponto de vista diplomático já há alguma tensão entre vizinhos, sob o ponto de vista económico também já há um braço de ferro que pode comprometer grandes projectos. O economista moçambicano Luís Magaço fala sobre as dinámicas destes importantes meios de escoamento de mercadoria a Deutsche Welle, numa conversa com Nádia Issufo.


Foto: Ismael Miquidade



Nádia Issufo: O Malawi depende dos corredores moçambicanos de Nacala e a linha de Sena, que não estão ainda a operar, para escoar os seus produtos.  Sendo assim, acha legítima esta vontade do Malawi de usar o rio Chire para escoar e receber as suas mercadorias ?
Luís Magaço: Eu acho que não, o rio Chire que depois atravessa Moçambique através do rio Zambeze, é um rio que está sob a soberania do governo moçambicano, portanto o Malawi não tem a legitimidade para usar a rota até ao Índico sem ter  por nuencia do governo moçambicano o troço que envolve a República de Moçambique.

NI: Economicamente o que significaria para Moçambique perder o Malawi como utilizador dos seus portos?
LM: Qualquer comercial que deixar de usar os nossos portos, assim como vê o caso do Zimbabwe cuja a situação económica condiciona imenso a utilização e a viabilização do porto da Beira, qualquer parceiro que deixe de usar os nossos portos tem um impacto económico e financeiro sobretudo signficativo, não há dúvidas. Agora, não se faz uma parceria comercial a qualquer preço, o governo moçambicano está a condicionar a viabilização do projecto a partir de um estudo ambiental, penso que há razões mais do que suficientes para que o governo do Malawi aguarde  pelos resultados do estudo por forma a tomar as decisões de utilização do rio.

NI: Então não se pode dizer que Moçambique está a "encurralar" o Malawi?
LM: Eu não diria isso, eu diria que houve da parte do Malawi um pouco a ingenuidade ou a arrogância  de tentar abusar do teritório da República de Moçambique e o governo moçambicano está a mostrar o que realmente pode, impedindo que o rio seja utilizado como via de escoamento do produto malawiano. Claro que isto é uma moeda com duas faces, em relação ao rio nós podemos inviabilizar o projecto malawiano, mas o Malawi  também pode inviabilizar o projecto de escoamento de  carvão através de Nacala, e pelo que oiço o Malawi não está  a facilitar a viazbilização da construção de uma linha ferrea através do seu território. É verdade que ainda é possível para Moçambique encontrar uma via alternativa, a via Dona Ana-Sena, e depois subir entre lagos, mas é uma via mais longa e mais dispendiosa.

NI: Moçambique poderá ceder face a essa posição do Malawi?
LM:  Em democracia há de facto um jogo de oportunidades, um jogo temporal. A seu tempo eu penso que os dois se vão entender e que o governo moçambicano vai viabilizar o escoamento do comércio externo do Malawi e este por sua vez vizbilizar a construção da linha ferrea para Nacala através do seu teritório. Eu penso que a seu tempo isso irá acontecer porque o braço de ferro não favorece as duas partes.

NI: A pressão que os CFM está a fazer a empresa indiana responsável pela linha de Sena e também a abertura da ponte Samora Machel em Tete será uma tentativa do governo de Moçambique de aliviar o Malawi que está com dificuldades de escoar e receber as suas mercadorias e ao mesmo tempo dar uma maior abertura para uma maior negociação no caso do corredor de Nacala?
LM: Nós vamos assistir nos próximos tempos a várias dinámicas económicas na região centro e em particular naquele eixo entre Tete, Nacala e o Oceano Índico, vamos ouvir falar de uma forte dinámica de interesses. Agora estamos a ouvir falar de empresas canadianas a anunciarem a descoberta de vários minérios na região de Tete, o interesse da Zâmbia pela utilização do porto da Beira, essa quase obsessão do Malawi pelo escoamento da sua produção. Cada uma das partes vai querer tirar o seu próprio proveito. Neste momento o braço de ferro entre Moçambique e o Malawi não favorece aos dois, porque nós perdemos com a não construção da linha ferrea e o Malawi perde com a não utilização do rio Zambeze.
Há uma parte signficativa do comércio externo do Malawi que é feita via Tanzânia e oMalawi durante muitos anos optou pelo porto de Durban ao invés de utilizar o porto da Beira. Entpa, em determinados momentos os países da região, neste caso o Malawi, tem adoptado estratégias diferenciadas para contornar algumas dificuldades. É uma grande verdade que o normal funcionamneto da ponte Samora Machel vai aliviar imenso o sufoco do Malawi no escoamento da sua produção. Quanto a empresa indiana, toda a gente estava impaciente porque nunca mais eles conluem o projecto para Moatize e isso pode comprometer os planos de exportação da Vale  e da Riversdale.

NI: Este consórcio indiano, para além do atraso na conclusão da linha de Sena mantém uma relação difícil com a Vale que quer escoar o seu carvão. Agora a emprsa brasileira vai acções no Corredor do Nacala por onde deverá escoar também o seu carvão. Quais são as implicações disto tudo?
LM: Para já pelo que me consta os indianos são uma carta fora do baralho, os CFM vão assumir a responsabilidade pela construção da linha, eu julgo que vão contratar outra empresa. O corredor da Beira continua a ser o troço mais curto a partir de Tete, a dificuldade tem a ver com o porto da Beira, mas penso que isso está equacionado, a Emodraga tem contratado dragas japonesas para fazer o assoreamento. Mesmo que a Vale conclua a linha de Nacala  vai continuar a exportar de forma mais barata a partir da Beira.

NI: Mas há vantagens para o país se a Vale tem comparticipação numa empresa que escoa o seu próprio produto?
LM: A Vale tem a sua própria rede  ferroviária, eu acho que o país tem a vantagem neste emprendimento se conseguir assegurar do consórcio que constrói a linha ferrea que Moçambique continuará a usar a mesma linha ferrea para o transporte de passageiros e de outras mercadorias para outros destinos, ou seja, desde que não seja privado.

NI: O que se pode esperar com estas dinámicas todas nos corredores de Nacala e da Beira?
LM: Primeiro que deixemos das guerras psicológicas, verbais e retaliações  através da imprensa e passemos a acção e coloquemos  as linhas ferreas a funcionarem para o desenvolvimento dos corredores, que estes sejam mais de desenvolvimento do que de transporte. Que ao longo das linhas ferreas se desenvolvam outros empreendimentos que favoreçam o país, e também neste caso o Malawi, e com isso se gere emprego.

NI: O porto de Nacala está muito bem localizado, existem naquela região empresas a fazerem prospecção de hidrocarbonetos, o projecto de areias pesadas também está próximo, prevê-se ainda a construção de um porto petrolífero, a região de Nacala também é industrial, para além de constituir um porto para o Interland, para o carvão de Tete e muitas outras coisas. Como enquadra este porto tomando em conta todos estes factores para o desenvolvimento de Moçambique?
LM: Ainda bem que temos um projecto ancôra para redinamizar o porto de Nacala. Ainda bem que temos um gigante mundial interessado em explorar uma linha ferrea que liga este porto, ouvi dizer que irão passar por dia, de Moatize para Nacala, 17 comboios e 118 carruagens por dia, isto é muito. Vai significar uma total mudança em toda a perspectiva de vida daquela zona, penso que tudo isto vai empregar uma novo valor ao porto de Nacala e atribuir-lhe a capacidade e a robustez necessária de um porto a altura do seu potencial. E isso será, para mim, um grande ganho numa altura em que se está já a transformar o aeroporto militar de Nacala num aeroporto internacional e civil. Isso significa que Nacala vai se tornar um entreposto importantíssimo da região centro e norte de Moçambique.  

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