Alemanha na literatura moçambicana é algo recente. Até agora Paulo Borges Coelho foi único escritor moçambicano a falar sobre a presença alemã em Moçambique nas suas obras. Motivos para isso não lhe faltam, afinal ele também é historiador. Mas é como escritor que Paulo Borges Coelho ganha cada vez mais visibilidade nos últimos tempos. O seu livro "O Olho de Herzog" valeu-lhe o Prémio Leya em 2009, e em Moçambique foi honrado com Prémio José Craveirinha, o mais importante do país, com a obra "As duas Sombras do Rio". E é sobre as estórias que escreve que a DW decidiu ouvi-lo hoje, numa entrevista conduzida por mim:
Nádia Issufo: É primeiramente conhecido como historiador, e mais tarde como escritor. Qual é a distância entre o mundo académico e a escrita literária?
Paulo Borges Coelho (PBC): A diferença é por um lado enorme, e por outro lado não é nenhuma. Enorme no sentido de que são duas formas de expressão totalmente distintas, enquanto que o paradigma do académico é a verdade, o historiador procura a verdade, e tudo o que ela tem de relativo, a escrita literária re-inventa o mundo, não está interessada no paradigma da verdade. Mas apesar desta enorme diferença estão próximas no sentido em que a minha visão do mundo é sempre influenciada pela visão do historiador, isso é transporto para a literatura.
NI: E de onde vem o gosto pela escrita?
PBC: Não sei dizer, sempre existiu, sempre foi uma forma de processar o real, através da leitura e da escrita. O que foi mais recente foi a publicação.
NI: O que o encorajou a publicar?
PBC: Talvez o facto de ter concluído que tinha alguma coisa a dizer. O meu primeiro livro, alias, nasceu de uma certa promiscuidade entre a investigação académica de um região e depois a escrita literária, ou seja, fui tomando notas e essas notas a partir de certa altura tomaram freio nos dentes encadearam-se caminharam para um romance, quando a princípio eram notas de trabalho.
NI:Que eu saiba é o único escritor moçambicano que retrata nas suas obras a presença colonial alemã em Moçambique. Há uma razão especial para isso?
PBC: Não. Eu sou originário, por parte da minha mãe, do norte de Moçambique. A minha mãe e a mãe dela são da pequena Ilha do Ibo e tenho na minha família sangue alemão, no sentido em que um bisavô era um embarcadiço alemão. Por isso sempre me interessou aquela região, não só pelo facto de ser alemão. Já há muitos anos, através da documentação, tive contacto com a história das campanhas militares do general von Lettow-Vorbeck no norte. Depois esse interesse reforçou-se, e até publiquei uma banda desenhada sobre essas operações, e a sentença reforçou-se não só pela literatura colonial portuguesa, mas também, mais tarde, com a leitura do próprio diário do general Lettow. De tal forma que achei que era interessante explorar literariamente.
NI: As suas obras são muito diferenciadas em termos de estilo, se olharmos para "O Olho de Herzog" e "As Visitas do Dr, Valdez" passando pela "Cidade dos Espelhos" constatamos que são completamente diferentes umas das outras. Pode-nos falar sobre esse seu lado multifacetado?
PBC: Eu na literatura não estou a procura de impor um ponto de vista, estou a procura de explorar um caminho que para mim é de alguma maneira fascinante e tentador, e portanto uma prática que me preenche bastante. Então nesse sentido eu sou escritor relativamente tardio. Portanto, o que me interessa é explorar diversos caminhos seguindo apelos que nem para mim são completamente. Então se houver uma coerência, vamos descobrir todos, não só os leitores, mas eu próprio que não tenha a partida não tenha nenhuma chave secreta. Nesse sentido para mim cada livro é uma experiência nova, quer do ponto de vista do que tenho para explorar, quer até do ponto de vista técnico e interessa-me explorar o máximo possível uma grande diversidade de caminhos.
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